-01- O século passado foi
Rico em criar personagens
Dos mais diversos matizes,
Das mais típicas linhagens;
Destacando, a lira arguta
Vai render a uma puta
As mais justas homenagens. |
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| -02-
CAMPINA GRANDE cresceu
Graças a força empenhada
Por forasteiros e filhos
Desta terra tão amada,
Dentre os nomes que se inscreve
Um � quem CAMPINA deve
É MARIA GARRAFADA. |
-03-
T odos deram ajuda GRANDE
Para construir CAMPINA
E MARIA GARRAFADA,
Logo cedo, bem menina,
Instalou próspero empório
Que tinha como escritório
As entranhas da vagina. |
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| -04-
MARIA foi tão somente
MARIA só, e mais nada,
Alquimista intuitiva
Criou meizinha afamada,
Que fabricava e vendia
A qual deu-lhe o nome um dia
De MARIA GARRAFADA. |
-05-
MARIA sem sobrenome
Sem passado ou tradição,
Sem procedência importante
Sem orgulho ou ambição
Sem apegos e sem laços
Viveu de vender pedaços
Do seu grande coração. |
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| -06-
Ela que mercadejava
O amor por atacado
Sabia os riscos que corre
Quem vive nesse mercado
Mesmo porque muitas vezes
Viu alguns dos seus fregueses
“Comprar produto” estragado. |
-07-
Antes da penicilina
A pessoa “premiada”
Com uma venérea estava
Numa tremenda enrascada
Da qual por vez não saia,
Para ajudá-los, MARIA,
Formulou a GARRAFADA. |
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| -08-
Ela que portava o mal
Também ofertava a cura
Não tinha culpa de ser
Objeto de procura,
Corria riscos constantes
Igual, ou mais que os amantes
Nessa vida de aventura. |
-09-
MARIA nos verdes anos
Fez da profissão antiga
Um sacerdócio e um bem,
Afável, doce e amiga;
Na idade matutina
Doou-se inteira � CAMPINA
Como prima-rapariga. |
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| -10-
No bordel de um leito só
Era um vai-e-vem diário
De gente importante e rica,
Camponês e proletário,
Velho fazendo mestrado
E jovem pouco ilustrado
Fazendo o curso primário. |
-11-
No Beco da Pororoca
Instalou seu paraíso
Aonde CAMPINA-homem
Baixava, quando preciso,
Na ânsia de conhecer
Os mistérios do prazer
O amor pleno e conciso. |
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| -12-
� Numa cama pobre e tosca
Sob a luz bruxuleante
Duma lamparina acesa
Com sua chama ondulante
Esfumaçava paixões
De imberbes rapagões
Nas mãos de MARIA amante. |
-13-
MARIA, corpo de louça,
Olhos ternos, voz serena,
Mãos de fada na carícia,
Parceira de Madalena
Nessa profissão sem nome
A não ser que você some
Nomes que vão a dezena. |
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| -14-
As prostitutas do mundo
Muitos outros nomes têm:
Um, Mulher da Vida Fácil
Pois acham que vivem bem,
Mas isso é pura besteira,
Quer ver se a vida é maneira?
Caia na vida também. |
-15-
Catraia, quenga, piranha
É assim que o povo chama,
Biscate, puta, rameira,
Quebra-galho, mulher-dama,
Mas sendo em sociedade
Ganha nova identidade
Pra ser Moça de Programa. |
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| -16-
A puta é como o palhaço
Que jamais pode deixar
T ransparecer seus problemas
Para não contrariar
Os que querem diversão
Mesmo porque a função
Precisa continuar. |
-17-
MARIA igual a Maria
Aquela da Palestina
Também sofreu seus tormentos
Mas sem maldizer a sina,
Padeceu no paraíso,
Se triste, fez-se em sorriso
Pelas noites de CAMPINA. |
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| -18-
Foi namorada e amante,
Conselheira e confidente
De uma cidade inteira
Rica de bens, mas carente
De um corpo disponível
Que aceitasse passível
O desfrute permanente. |
-19-
MARIA dava de graça,
Por muito, ou pouco dinheiro,
Seu negócio era manter
Os fregueses do puteiro
Onde era Mestra e Doutora,
Dona, serva e criadora
Do comércio pioneiro. |
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| -20-
Numa ruazinha estreita
MARIA fez o seu ninho
Onde – vendia um “pedaço”
do corpo – ou dava todinho,
Alma, vida, coração,
Mais amor, e mais paixão,
Mais ternura e mais carinho. |
-21-
“Comprar” mulher não é coisa
Que se chame novidade,
Você “compra, paga e usa”
Quando bem lhe dá vontade,
“Come” e fica satisfeito
Mas deixa do mesmo jeito
Pra outra oportunidade. |
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| -22-
Desse-lhe um copo de vinho,
Uma dose de licor
Ou uma pequena cédula
Do mais ínfimo valor
Isso bastava a MARIA
E ela retribuía
Com uma taça de amor. |
-23-
Estava sempre ao dispor
Quer de noite, quer de dia,
Era só bater de leve
Ela solícita atendia,
Para a cidade carente
MARIA literalmente
Pernas e portas abria. |
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| -24-
Na alcova MARIA
foi Passiva, ativa, instrutora,
Recatada, libertina,
Maternal e professora
Por isso reconhecida
MARIA foi nessa vida
A mais Santa-pecadora. |
-25-
MARIA ensinou CAMPINA
A arte da putaria,
Moça cair na fuzarca,
Rapaz “chupar” porcaria;
Velho quando estava seco
Era só passar no Beco
E afogar-se em MARIA. |
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| -26-
Muitas damas da cidade
Hoje matronas casadas,
Com esposo/filhos, netos,
Proles bem estruturadas;
Não esquecem que um dia
Foram da Mestra MARIA
Alunas bem aplicadas. |
-27-
Estou relembrando isso
Mas sem recriminação,
Quem deu, se deu porque quis,
Por amor, ou precisão,
Deu uma coisa que dando,
Não diminui, vai somando
Prazer e satisfação. |
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| -28-
Também muitos cavalheiros
Dos quais ninguém desconfia
Freqüentando a Pororoca
Forçaram na fantasia,
Em noites de vinho e tara
Findaram metendo a cara
Entre as pernas de MARIA. |
-29-
Nesse caso eu digo o mesmo,
Se fez e fez porque quis,
Sem MARIA forçar muito
A cara do infeliz
Não vou condenar ninguém
Pois cá pra nós, eu também
Algumas besteiras fiz. |
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| -30-
Mesmo o passado só serve
Para lembrar no futuro
E aquilo que se deu
Numa alcova ou quarto escuro
Só aos dois interessa
Sendo melhor que a conversa
Jamais ultrapasse o muro. |
-31-
Homem vence touro brabo
Mas a mulher o “derruba”
Anotem, pois alguns nomes
Dos que fizeram suruba
Com MARIA GARRAFADA:
- Seu Terto passou noitada
Com Severo e Carnaúba. |
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| -32-
Francisco da Marinete,
Carlos, dono do Abrigo
Numa noite fraquejaram
Igualzinho � seu Rodrigo
Que ao lembrar-se do Beco
Ficava engolindo em seco,
Porque? Eu sei, mas não digo. |
-33-
Dr. William de Brito
Ilustre cardiopata
Numa noite de gandaia
Bebeu que meiou a lata
Depois caiu na orgia
E lambeu tanto MARIA
Que ficou de venta chata. |
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| -34-
O industrial Serginho
Aquele da Tecelagem
Era lambedor de fama
E contava pabulagem;
O Chefe da Estação
Num concurso de chupão
Ganhou com 10 de vantagem. |
-35-
Mesmo arriscando o pescoço
De delatar eu não fujo
Pois MARIA me contou
Que o empresário Araújo
Nas noites que a visitava
Dificilmente escapava
Sair de bigode sujo. |
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| -36-
Na lista dos lambe-lambe
Estão Quirino e Lindolfo,
Anézio, Mário e Luiz,
Asdrúbal, Santos, Rodolfo,
Tavares, Costinha, Paulo,
Wanduy, Marquito, Saulo,
José, Valdez e Sindolfo. |
-37-
Alfredo da Padaria,
T enório, Cícero, Cabral,
Antunes que ajudava
As missas da Catedral;
Segundo contou MARIA
A relação encheria
Um caderno de jornal. |
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| -38-
Por favor, não vão sair
Suspeitando de ninguém
Porque os nomes acima
São fictícios e quem
Vai fazer o papel feio
De mostrar o erro alheio
Se tem seus erros também? |
-39-
Os nomes foram trocados
Mas a história é real,
O Beco da Pororoca
Por décadas foi o local
Onde se achava MARIA
E a cidade fazia Repetido bacanal. |
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| -40-
Na Escola da Pororoca
A estudantada via
Uma oportunidade
De aprender anatomia,
MARIA ensinava tudo
Era o compêndio de estudo
Onde a moçada aprendia. |
-41-
Foi desgastando-se aos poucos
De tanto ser folheada,
Cada ruga que surgia
Era uma folha rasgada,
Chegando ao final do conto,
Resta uma cruz, como ponto,
De MARIA GARRAFADA. |
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| -42-
MARIA, jovem, vendia
Beleza, lascívia e graça
E quando passava enchia
De brilho os olhos da praça
Mas o tempo foi passando
E MARIA foi ficando
Como vitral que se embaça. |
-43-
Seus trejeitos sensuais,
Seus meneios provocantes,
Seu corpo de saciar
A sede de mil amantes
Dando amor e recebendo
Aos poucos foi perdendo
As belas formas de antes. |
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| -44-
MARIA, Santa MARIA
Deu a cidade que amou
Seu corpo em flor de menina
Assim que desabrochou,
Mas como tudo é furtivo,
Um dia, assim, sem motivo
MARIA inerte, murchou. |
-45-
CAMPINA sentindo falta
Da puta mais festejada
Mestra na arte sublime
De dar prazer � moçada
Por ser de pleno direito
Queda-se rendendo um pleito
A MARIA GARRAFADA. |
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| -46-
CAMPINA cidade obreira
Feita por gente impoluta
É GRANDE porque nasceu
Com muito trabalho e luta
De criadores, tropeiros,
Filhos natos, forasteiros,
Índio, branco, preto e puta. |
-47-
M – ÁRIA, estes versos são
A – minha humilde oferenda
N – ão devo esquecer que em vida
O – teu corpo esteve � venda;
E – ras Santa e dissoluta,
L – inda, pecadora e puta,
M – ULHER, mulher, rica prenda.
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